“Unwanted”, de Dorothée Munyaneza: um relato a partir das histórias reais das vítimas do genocídio em Ruanda

por Comunidade Cultura e Arte,    28 Janeiro, 2019
“Unwanted”, de Dorothée Munyaneza: um relato a partir das histórias reais das vítimas do genocídio em Ruanda
Fotografia de Christophe Raynaud de Lage
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Na sexta-feira, dia 1 de fevereiro, Dorothée Munyaneza apresenta, em estreia nacional, no Teatro Campo Alegre, o espetáculo “Unwanted” – um trabalho que conta a história de mulheres violadas em Ruanda

A violação é considerada ainda como uma arma de destruição em massa nas zonas de conflito. Violações que originam crianças traumatizadas pela história que carregam, um peso em torno do seu nascimento que as acompanhará para toda a vida. Para escrever esta história, Dorothée Munyaneza foi ao encontro de mães rejeitadas, mulheres feridas pelas circunstâncias de uma vida que não planearam, e a quem lhes foi feita sempre a mesma pergunta, como início de conversa: “Depois do que lhe aconteceu, o que fez para se aceitar como é?”. Um relato a partir de histórias reais, de mulheres que se viram violentadas na sua intimidade.

Depois de em março de 2017 ter apresentado, também em estreia nacional, “Samedi Détente”, no âmbito do Foco Deslocações, Dorothée continua a sua jornada artística numa perspectiva muito pessoal: “Tenho um interesse especial no corpo feminino, especialmente quando maltratado, abusado, física e mentalmente, em tempos de guerra. Este trabalho sobre o corpo feminino só poderia ter origem no meu país, com as vítimas do genocídio”.

Os números não são precisos, mas em Ruanda, entre abril e julho de 1994, cerca de 100.000 a 250.000 mulheres foram violadas durante o massacre de 100 dias, que no total matou 800.000 pessoas.

O que aconteceu há 22 anos atrás aquelas mães e crianças assustou-me, inevitavelmente. Quero dar um passo para trás da minha história para agora transmitir a deles.”, explica Dorothée

Sobre o processo de trabalho, as mulheres e crianças que conheceu e entrevistou, Dorothée explica que durante a sua pesquisa encontrou várias vezes o nome Godeliève Mukasarasi, que em 1994 fundou a Sevota – uma instituição de caridade que ajuda mulheres tutsis vítimas de violação sexual durante o genocídio. Conta que “Godeliève apresentou-me a mulheres que optaram não abortar e ter o filho. Muitos deles são seropositivos, pobres e socialmente excluídos. A maioria teve que fugir da sua aldeia para encontrar segurança e uma vida mais calma no campo, mas ainda estão a ser apontados, assim como os seus filhos”.

Inicialmente, Dorothée temia que não falassem por modéstia, respeito ou medo. “Pensei que ia encontrar mulheres despedaçadas, mas longe disso: os seus testemunhos foram além da generosidade, beleza e dignidade. Tinha diante de mim uma mulher que sofrera, que ainda sofria, mas que estava em pé, a lutar pela luz.”

A coreógrafa conheceu cerca de 60 mulheres e 70 crianças, e entrevistou-as nas suas casas, umas vezes com Godeliève e outras vezes sozinha. Contou-lhes a sua história fez uma pergunta: “Aceitas-te?” E foi aí que as histórias começaram. “Partilharam a sua história sem insistir na violação, apenas sugerindo-o que ‘alguém se comportou mal comigo’. Perguntei então se poderia tirar uma foto deles com minha máquina descartável e eles saiam da sala e voltavam vestidos com os seus trajes mais bonitos e coloridos. Essas mulheres, por mais que sofressem, ainda valorizam seus corpos e a si mesmas.”

O espetáculo é apresentado, em récita única, na sexta-feira, dia 1 de fevereiro, no Campo Alegre, às 21h00.

Fevereiro
1 Sex 21h00
Campo Alegre Auditório
10.00€ >12

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