Uma noite de agressividade contida com Protomartyr

por Bernardo Crastes,    15 Abril, 2018
Uma noite de agressividade contida com Protomartyr
Fotografia de Ana Viotti / Musicbox
PUB

Já passava das 22h30 quando a banda de Detroit, que faz uma raça de post-punk falado (ou gritado), subiu ao palco do pequeno e lotado Musicbox, em Lisboa. Guitarrista, baixista e vocalista alinharam-se na frente de palco, autênticas torres que contrastavam com o baterista mais pequeno, que tocaria numa bateria que parecia construída para ocupar o menor espaço possível. Joe Casey, o vocalista, pousa um copo de whisky na mesa e tira quatro garrafas de cerveja dos vários bolsos do seu blazer. O concerto está pronto a começar.

O mote foi dado por “My Children”, um dos destaques do último álbum, Relatives in Descent. O som saía limpo e bem definido do palco, mas parecia não envolver o público como devia. Foi algo que se manteve durante as primeiras cinco canções, tragicamente apanhando uma das melhores canções da banda: “I Forgive You”, que soou mais estéril, não se aproximando tanto da anarquia punk que a caracteriza. A banda também pareceu levar o seu tempo a entrar nos eixos, neste que foi o primeiro concerto da tour que os levará a tocar pela Europa fora. Este início trouxe com ele duas canções novas: “Wait” e “Win, Always”, que soaram interessantes, levando o som da banda em direcções novas, que certamente desbravarão no próximo álbum.

O concerto encarrilou totalmente a partir de “Windsor Hum”, que trouxe ao de cima o que o último álbum tem de melhor, um mood nocturno que se adequou bastante à noite lisboeta passada naquele recinto tão icónico. O público celebrou efusivamente as canções que já reconhecia de Under Color of Official Right, incentivando a banda a tocar com afinco. Joe Casey dinamizou mais a sua performance, gritando intensamente a sua poesia moderna para o microfone, baixando e levantando o suporte nervosamente, até acabar por parti-lo – facto que encarou com indiferença, fazendo um sinal distraído de perdão à pessoa que possivelmente poderia ter levado com o suporte que caiu. O que importava ali era a música e partilhar os problemas do mundo actual com o público que os quiser ouvir.

Fotografia de Ana Viotti / Musicbox

“Up the Tower”, também de Relatives in Descent, transpôs bem a intensidade do álbum para o concerto, sem que o baterista Alex Leonard vacilasse quando chegou a altura do seu clímax ruidoso. Há que admirar a stamina de Leonard, que pouco espaço dava para palmas, com as canções rápidas e compactas a seguirem-se umas às outras como foguetes. O estilo da banda – música com uma agressividade contida, mas cheia de nuances líricas – lucra com este ritmo elevado, tornando o concerto numa espécie de sessão de poesia urbana alucinante. Por exemplo, o ritmo determinado da canção que inicia este parágrafo – história fantasiosa sobre um troll sedento de dinheiro que vive numa torre e será destronado pelo povo (se pensarmos arduamente, podemos imaginar uma história que se poderá tornar real) – converte-se na divertida “Male Plague” sem pausas. Assim, há uma maior fluidez no ambiente do concerto, e até na sonoridade.

Convenhamos que a banda também sabe escolher bem a sua setlist. Equilibrando bem os seus trabalhos (apesar da falta de estandartes de The Agent Intellect, como “Boyce or Boice” ou “Cowards Starve”), conseguiu agradar o público, que esteve surpreendentemente quieto ao longo de todo o concerto, apesar do entusiasmo com que aplaudia as canções. Nem a ginga groovy da excelente “Here is the Thing” os faz mexer mais do que o necessário. Inicialmente foi de estranhar, mas após pensar um pouco, isso também acaba por coadunar com o tal estilo contido da banda: as canções tanto podem suscitar este tipo de reacções mais subtis, assim como resultar numa explosão por parte do público. Basta uma faísca.

O final veio com “two of our shittiest songs”, nas palavras de Joe Casey, que estava bastante espirituoso (não duvidamos, tendo em conta a bebida que levou para o palco). Exemplo: um membro da audiência clamou por “Cowards Starve”, ao que o vocalista retorquiu “Howard Stern? Eu conheço esse gajo”. Relativamente ao que disse no início do encore, não diríamos que “Why Does It Shake?” seja uma música merdosa – muito pelo contrário. Foi um concerto que certamente encheu as medidas dos fãs, nesta estreia dos Protomartyr em Lisboa.

Gostas do trabalho da Comunidade Cultura e Arte?

Podes apoiar a partir de 1€ por mês.

Artigos Relacionados