“Primeiro Amor”, o boxe cinematográfico de Takashi Miike

por João Estróia Vieira,    17 Dezembro, 2020
“Primeiro Amor”, o boxe cinematográfico de Takashi Miike
“Primeiro Amor”, de Takashi Miike
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Ninguém começará um filme de Takashi Miike sem esperar derrame abrupto de sangue, violência gratuita, perda de membros e sequências de golpes trocados entre personagens. Muitos poderão ver nesta constante permuta de violência, sangue e brutidão o resumo de um combate de boxe. Para outros, o boxe é bem mais que isso e o sapateado, a coordenação motora, a técnica, a defesa e a leitura de movimentos em microssegundos são componentes quase artísticas de alguém que se prepara até aos limites das suas capacidades humanas. Também o é o cinema de Takashi Miike, ou pelo menos é essa possibilidade de dupla interpretação consoante o espectador. O prato principal, o sangue, não demora, conseguindo o realizador fazer “rolar cabeças” desde cedo.

Leo (Masataka Kubota) é um promissor boxeur e o protagonista deste “Primeiro Amor”, vestindo um casaco vermelho à James Dean, versão “Rebel Without a Cause” revisitada. Após saber que tem um tumor inoperável no cérebro é apanhado por acidente numa trama entre um Yakuza e um polícia corrupto que tentam culpar a jovem Monica (Sakurako Konishi) de desviar um carregamento de droga enquanto esta se prostitui para pagar uma dívida à máfia japonesa. O que é que uma história que já vimos tantas vezes como a da “dama em apuros”, mais ou menos reconstruída e com reformulações estéticas amiúde, tem então para trazer de novo? O entretenimento ímpar e a visão única de um realizador como Takashi Miike.

Os braços e cabeças a saltar, sempre com propósitos “humorísticos”, bem como um peluche a gerar uma explosão ou uma assombração do pai abuso de Yuri/Monica em cuecas brancas são toques distintos e idiossincráticos que perduram na mente de quem visualiza e se deixa levar num filme que parece sempre decorrer a grande velocidade. Voltando ao peluche, é este aparente confronto entre algo tão imaculado e a perversidade e o pecado que simboliza tão bem este filme de Miike. O humanismo presente em actos de perdão ou compreensão em algumas mensagens expostas durante o filme expõem que a temível aparência de um braço caído pode ser colocada em plano secundário alertando que o conteúdo se sobrepõe à forma e que se pode, de facto, brincar com “coisas sérias”.

A banda sonora a cargo do prolífico companheiro de Takashi, Kôji Endô e as suas sonoridades jazzy potenciam ao máximo uma experiência punk rock com momentos cartoonescos a reavivar a memória sobre os antigos filmes policiais com grandes manobras de carros e perseguições. O cinema de Takashi Miike é um combate de boxe. Arte ou violência? Neste caso, porque não ambas?

Depois da sua antestreia no MotelX, Primeiro Amor (First Love) é um filme Cinema BOLD que estreia a 17 de Dezembro nos cinemas e estará disponível a partir de 24 de Dezembro nos videoclubes das televisões (MEO, NOS, NOWO e Vodafone) e em Filmin.pt. 

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