‘Prequelle’: de todos os demónios que conhecemos, nenhum se compara a Ghost

por Comunidade Cultura e Arte,    8 Junho, 2018
‘Prequelle’: de todos os demónios que conhecemos, nenhum se compara a Ghost
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De todos os demónios que conhecemos, nenhum se compara a Ghost. Esta é uma frase que facilmente descreve o conjunto sueco. Para os mais distraídos Ghost é uma banda formada em 2006 na cidade de Linköping, Suécia e o que inicialmente resultou num primeiro trabalho mais metal e underground (Opus Eponymous, 2010) evoluiu ao longo dos anos para um rock/hard rock mais comercial e retro com uma ligeira veia progressiva. No mesmo sentido a sua teatralidade, claramente muito inspirada por bandas como Kiss e Alice Cooper, também cresceu. No meio disto tudo a banda conseguiu múltiplas nomeações para prémios tendo inclusive ganho o Grammy em 2016 na categoria de Best Metal Performance.

E qual é a particularidade de Ghost? Pois bem, Ghost é uma banda satânica em que até meados do ano passado ninguém conhecia a identidade de quem estava por trás da mesma. Em palco – e fora dele – a banda é liderada por um “Papa” vestido a rigor, o vocalista/letrista/compositor Tobias Forge, e todos os músicos estão vestidos e mascarados de igual forma. Estes fatores, aliados a uma forte campanha de marketing baseada no seu secretismo, conseguiram que a banda permanecesse cerca de 11 anos em relativa anonimidade, até 2017 quando todos os membros da banda processaram Tobias Forge por quebras contratuais. Na sequência deste processo, Forge assumiu a sua identidade como líder, compositor e estratega de toda a visão da banda, tendo prosseguido as tours com outros músicos.

Relativamente aos espetáculos Ghost apresenta-os como se fossem uma missa, e nas redes sociais refere-se à sua organização como “The Clergy”, sendo que para cada álbum normalmente é nomeado um novo “Papa”. Nos últimos tempos realizaram também pequenas curtas-metragens como promoção ao Prequelle. A antecipação para o Prequelle surge no início do ano quando nas redes sociais Ghost informa, numa série de vídeos cómicos, que vai substituir o “Papa Emeritus III” pelo “Cardeal Copia”, sendo que desde então, e até à data de lançamento, dois singles foram lançados: “Rats” e “Dance Macabre”.

Prequelle pega tematicamente na grande praga de peste negra que assolou a Europa, principalmente no século XIV., sendo que ao longo de todo o álbum é sugerido que esta praga foi de certa forma uma espécie de purga comandada por Satanás, de forma a castigar aqueles que não o veneravam, e como Deus foi impotente e despreocupado em pará-lo. Se este parece um tema pesado, a música já não o é. Prequelle é um álbum diferente dos anteriores: muito mais comercial e de estruturas bem simples em que é difícil não encontrar uma música orelhuda. Músicas como “Rats”, “Dance Macabre”, “Pro Memoria” e “Witch Image” são o exemplo perfeito do que falamos: riffs simples, refrões orelhudos, solos de guitarra e teclados épicos. A fórmula está feita. Mas a verdade é que é difícil construir um bom refrão e uma boa música que seja radio hit e nesse aspeto, se ignorarmos as letras a adorar o diabo, estas músicas são-no.

O único momento verdadeiramente heavy metal surge com a música “Faith”, cujo passo lento e riff bruto é mais uma vez acompanhado por uma melodia super cativante. Já as músicas “See The Light”, “Life Eternal” e “Pro Memoria” são as baladas do álbum. De assinalar esta última como uma das melhores músicas que a banda já apresentou. “Pro Memoria” é uma balada épica sobre a fragilidade da vida e apresentando o ponto de vista de um moribundo e a sua consciência blasfema. “Pro Memoria” é também talvez uma das poucas que se segura por si própria se a retirarmos de contexto, dada a ambiguidade da sua letra. De referir também as músicas instrumentais “Miasma” e “Helvetesfonster”, músicas onde a banda aproveitou para mostrar toda a sua técnica e aqui sim, a sua veia de rock progressivo. De assinalar com particular agrado o brilhante solo de saxofone com que inesperadamente “Miasma” termina.

Tecnicamente, ao compararmos com o homólogo Meliora (2015), este é um álbum que não exige muito dos músicos, estando absolutamente dedicado á qualidade das melodias e aos eventuais espetáculos futuros. Os riffs são simples, no entanto não é por isso que não se devam destacar os guitarristas com os seus fantásticos solos e que, em conjunto com os sintetizadores cada vez mais presentes, conferem uma aura retro a todo o álbum. Uma palavra de apresso também para o trabalho realizado pelo baixo: se em álbuns anteriores este sempre foi um dos aspetos mais fortes, em Prequelle não é excepção. A bateria, no entanto, sentimos que talvez pela simplificação técnica da música não tem propriamente um momento que se destaque, ao contrário de álbuns anteriores em que músicas como “Con Clavi con Dio”, “Jigolo Har Megiddo” ou “From the Pinnacle to the Pit” a mesma acrescentava uma dinâmica diferente à música. Mas não é por ser menos técnico que a música é pior, muito pelo contrário, é bastante complicado criar algo simples, apelativo e com qualidade, o que, sem dúvida, acontece neste álbum.

De referir que com este álbum Ghost está a prever e aceitar aquilo que são: o próximo grande fenómeno comercial do rock/metal internacional. Isso significa também que álbuns como o Opus Eponymous (2010) e o seu heavy metal underground provavelmente não irão surgir num futuro próximo. Mas como em muitas outras bandas temos que saber aproveitar o presente, principalmente se este significar qualidade e que no caso de Ghost é inegável.

Ghost surge também numa altura importante da sociedade mostrando-nos que é possível brincar com assuntos sérios e ter sucesso. Prequelle é um álbum que deve ser ouvido e que tem tudo para levar Ghost a um novo nível no que aos concertos diz respeito, pois estes são sempre uma experiência única e de um entretenimento sem igual.

Crítica de Pedro Piedade

 

 

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