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O poder do sim, na Arábia Saudita

por António Pedro Moreira
11 Novembro, 2020
em Crónicas
Origin Story

Fotografia de João Amorim

O poder do sim e a magia de ser chutado de canto para canto. Mas o chuto, mais que de uma bota de ferro vem num formato que se conhece mas nem sempre se reconhece. Pois ora vem num sorriso tímido de um transeunte, num abraço inesperado, num chamamento calmo vindo de um velho de barba branca. O poder do sim só se mascara de si mesmo e é uma máscara que nos deixa indecisos entre o receio do desconhecido ou o entusiasmo por aquilo que não se conhece.

O velho aparece numa rua de compatriotas sauditas, filipinos, bengalis e três portugueses. Um a seis metros, outro mais perto, e o rapaz mais atrás, a registar o que passa por nós, nós que passamos por aqui. Cadeiras são puxadas, chás são servidos, livros sagrados oferecidos, livros mais pequenos em espanhol, um convite para jantar e outro para a observação da próxima celebração. O poder do sim não nos deixa pensar e gentilmente nos empurra. Quase de mão dada pelo nosso recém-conhecido dobramos a esquina, passamos pelos lavatórios onde os fiéis purificam o corpo antes de purificarem a mente, e entramos num modesto templo, sentando-nos num canto. Deixados sozinhos somos abordados por uma cara que encerra curiosidade e hostilidade. “Não, fomos convidados por um senhor…” dizemos. “Qual senhor?” Apontamos mas ele deixa-nos, caminhando decidido em direcção a uma resposta se faz parecer de expulsão. Um gigante de barba branca com a típica keffiyeh vermelha e branca abeira-se de nós e eu vejo-nos lá fora, daí a uns segundos. Mas, antes de proferir, daí a uns minutos, as suas palavras sagradas dirigidas ao seu deus, profere as nossas para o nosso, aquele par de termos que se conjugam num simples “No problem.” “Querem ficar aqui ou lá à frente?” pergunta, ainda. “Lá à frente” respondemos, no mesmo instante.

Os acontecimentos precipitam-se e, quando lá chegámos, o sangue a aquecer ligeiramente, passa-me pela cabeça que tínhamos saído de casa com o objectivo de ir ao barbeiro e, falhando isso, trocar dinheiro. Virados todos para o destino que nos é proibido, os devotos agacham-se ao nível mais baixo possível, o peso de deus a carregar-lhes nas costas, e levantam-se, a pesada fé que carregam tornando-os, por um momento, um pouco mais leves. Um senhor não consegue baixar-se até ao fim e eu reparo nele, um farol num mar de uma devoção que me é tão desconhecida.

Mas o dia não se cansa de nós e nós queremos mais dele. “Devíamos falar com ele a ver se ele pode ir connosco à maior mesquita daqui” sugere o João. Algumas mensagens, a quase-promessa de “It’s very possible” e aquele remate de “Someone will contact you.” Agarramos as estradas e as ruas e as pessoas que nos vêm dar chás para beber ou gafanhotos para comer ou pedir fotografias para tirar, e a hora aproxima-se do táxi que nos leva à mesquita e ao Saed, o nosso professor para as próximas horas, que vemos chegar quando a noite se apresenta. A simpatia do jovem-adulto abraça-nos. Serve-nos café árabe, que agora já sabe melhor, tâmaras, da milésima forma diferente de se apresentar que eu vejo, e encaminha-nos para o segundo andar de um dos milhões de lares do seu deus. A alcatifa é castanha e alta e um gigante candeeiro ilumina alguns dos seus irmãos que se vão reunindo lá em baixo. Uma pausa para ir rezar, um regresso e a explicação a três meninos de escola acerca daquilo em que acredita. Perguntas retóricas são lançadas e, por vezes, como nessa manhã, o meu sangue aquece um pouco, até que chega a ferver, quando a fatídica pergunta acerca da minha crença aparece. “Eu… não acredito em deus.” E a aceitação, apesar do conselho da cautela com tal afirmação. E a conversa e as perguntas e o convite para jantar e o paulatino câmbio entre professor e alunos para amigo com amigos. “Vocês têm de comer tudo” diz, com um sorriso, apontando para os iogurtes líquidos, as garrafas de água, o pão, as três travessas de arroz, o frango de churrasco, o tachinho com carne de ovelha e o outro com outra carne qualquer, aquilo que não é humos mas parece, o outro prato que não é arroz-doce mas parece e os vegetais cortados aos quadradinhos. E a libertação dele para falar de temas que, momentos antes, não planeara e que nós, nesses anteriores momentos, nunca sonháramos ouvir. Um dia fechado com o derradeiro presente. Além de todo o seu tempo, da oferta de jantar, três exemplares do livro pilar da sua VIDA na língua de Saramago.

Um dia feito de horas desconhecidas, de aprendizagens e partilhas. Um dia com o ingrediente do sim que, ainda que nem sempre, a tão bom porto nos leva.

2h42, d, 2 de Fevereiro 2020

Riad, Arábia Saudita

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