O medo leva à doença mental

por Comunidade Cultura e Arte,    8 Março, 2019
O medo leva à doença mental
Ilustração de Nosipho Nxele
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Hoje é dia da mulher, um dia em que se celebra a vida, quem dá à luz e o direito à igualdade da liberdade de expressão; no entanto, estes temas são apresentados no contexto de morte, escuridão e silêncio.
Isto acontece por diversas razões, uma delas é a chamada de atenção para realidades passadas, quem não sabe a história tende a repeti-la. Tal como são lembradas as vítimas de guerra, são lembradas as mulheres mortas e brutalizadas, mas com a diferença de que, na maior parte das vezes, a violência doméstica é uma guerra unilateral, sem tréguas.

Enquanto estudante de Psicologia, penso que seja importante estudar e perceber a mente de quem agride, ao invés de afirmar que “quem é violento é violento porque sim” ou “quem agride é um monstro e merece simplesmente morrer!”; há muito mais para além do que se vê nos comportamentos das pessoas, afirmar com toda a convicção que estas agressões acontecem apenas por causa do poder opressor do patriarcado ou por causa da misoginia é fazer um julgamento muito rasteiro da realidade.

Acredito que todos os seres humanos nascem sem nenhuma noção do que é a moralidade, e que cada um define os limites da sua moralidade ao longo da vida, e que esta é moldada pelas experiências vividas, mas uma coisa que todos os seres humanos experienciam desde in utero até à morte, é o afeto ou a falta dele. Penso que “afeto” é a palavra chave para percebermos o que vai no inconsciente do agressor.

Apenas para clarificar, qualquer pessoa pode ser agressor OU vítima, e a violência pode ser física ou mental.
Se um rapaz (por exemplo) cresce sob a asa de pessoas que gritam, discutem, resolvem conflitos através da agressão, não lhe dão afeto e o oprimem, etc etc… como acham que vai ser enquanto homem? Vai ser uma pessoa naturalmente afetuosa e carinhosa? A probabilidade é muito baixa. Muitos agressores são-no porque eles próprios já foram agredidos no passado. Isto leva-nos a entender que o problema está na educação e que a violência é algo não intrínseco ao sujeito,  mas sim algo que lhe é, de certa forma, “plantado” no inconsciente.

A violência é a manifestação física da frustração que o indivíduo sente consigo mesmo, é uma ação impulsiva e não pensada, executada por uma pessoa mentalmente instável.

A instabilidade emocional, fruto de experiências traumáticas que o indivíduo pode nem saber que o afetam, leva a que este agrida  pessoas em quem vê uma imagem de quem sempre o agrediu. É por esta razão que os maridos agridem as mulheres, e as mulheres e homens agridem os filhos, pois vêem neles a imagem de pessoas que representariam supostamente o “amor”. O medo e insegurança crescem ao longo dos anos, muitas vezes alimentados por teorias complexas que o agressor cria na sua cabeça para tentar justificar a si mesmo aquele desejo de prejudicar quem ama (É por isto que muitos casos de violência doméstica começam por suspeitas de infidelidade).

Quem agride é perturbado, mas é-lo porque nunca teve ajuda mental. É preciso abandonar o estigma de que “ir a um psicólogo é para malucos”, porque se muitos destes agressores tivessem tido acesso a apoio psicológico, podiam ter resolvido as suas frustrações internas de modo saudável para si e para quem os rodeia, e podíamos ter menos mulheres mortas naquela lista de 12, e na lista de centenas de mulheres agredidas.

Quando nascemos não somos monstros, mas se crescemos rodeados pelo medo e pela violência, existe uma elevada probabilidade de aplicarmos esse medo e essa violência a quem nos é próximo, e quando isso acontece, transformamos o amor em ódio e o medo em agressão.

Crónica de Ricardo Crato
Estudante do mestrado integrado em psicologia no ISPA – Instituto Universitário de Ciências Psicológicas, Sociais e da Vida

Linhas telefónicas de apoio à vítima e ajuda na prevenção de suicídio
APAV – Linha de Apoio à Vítima
116 006 (dias úteis das 9h às 21h)
CIG – Comissão para Igualdade de Género
800 202 148 (24 horas por dia)
SOS – Serviço Nacional de Socorro
112
SOS Voz Amiga
21 354 45 45 ; 91 280 26 69 ; 96 352 46 60 (entre as 16 e as 24h00)
Telefone da Amizade
22 832 35 35
Escutar – Voz de Apoio – Gaia
22 550 60 70
SOS Estudante
(20h00 à 1h00)
969 554 545
Vozes Amigas de Esperança
22 208 07 07 (20h00 às 23h00)
Linha Internet Segura
800 21 90 90
Conversa Amiga
808 237 327 ; 210 027 159
Telefone da Esperança
222 030 707

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