Mount Kimbie: “Temos de aprender tanto quanto podemos de uma audiência”

por Sara Miguel Dias,    13 Setembro, 2018
Mount Kimbie: “Temos de aprender tanto quanto podemos de uma audiência”
PUB

Avizinha-se o final da época festivaleira; e, com ele, chega um dos grandes eventos de música eletrónica de Lisboa – o Nova Batida. O festival é encabeçado dia 14 de Setembro pelos Mount Kimbie, que desde a última vez que passaram por Portugal lançaram um novo álbum. Love What Survives, de 2017, é um brilhante mix de eletrónica com instrumentalização mais clássica, que perfaz uma sonoridade contemporânea marcantemente londrina – basta pensar-se nos seus frequentes colaboradores, James Blake, Micachu ou King Krule. Tivemos o prazer de entrar em contacto com um dos membros da dupla britânica, Dominic Maker, que, por entre horas atarefadas de viagens, soundchecks e concertos, nos falou um pouco deste novo álbum, das suas influências, e das expetativas para o regresso à capital portuguesa.

Começando pelo início, tu e o Kai [Campos] conheceram-se na faculdade. Sendo uma dupla, como é que descobriram que estavam interessados no mesmo estilo de música e em criar sonoridades semelhantes?
Eu penso que através do convívio e de misturarmos coisas juntos. Honestamente, nesses tempos era mais acerca de descobrir nova música juntos, do que propriamente mostrar coisas que já tínhamos ouvido antes um ao outro. Foi há tanto tempo, há onze anos que estamos a fazer isto juntos. Mas sim, tentávamos encontrar novos sons, artistas e padrões que nos interessassem.

E agora uma década mais tarde lançaram um terceiro LP, Love What Survives. Quando estão a fazer um álbum, procuram seguir uma linha narrativa com os que o antecedem ou focam-se mais em cada álbum individualmente, em termos de temática?
Acho que não há muito a ir para o tema geral daquilo que nós lançamos, tende mais a ficar como sai no momento. Quando escrevemos música costumamos criar uma coleção de artistas que estamos a ouvir nesse momento, e a partir daí encontrar o som que queremos fazer. Para o Love What Survives ouvimos muito soul antigo com drum machines e também bastante post punk, e conseguimos tirar ideias desses estilos.

Realmente as músicas neste álbum parecem crescer muito mais rapidamente do que no Cold Spring Faultless Youth.
Sim, sim, eu concordo. Para este álbum o equipamento que tínhamos disponível e em que íamos pegando no estúdio é que acabou por moldar muito a coisa toda. Usámos basicamente quatro ou cinco instrumentos diferentes e foi essa a nossa limitação.

Pegando em algumas músicas particularmente. “We Go Home Together” que têm com o James Blake, parece ter uma enorme carga emocional. Trabalharam com o James nela desde o início, ou o James veio mais tarde e adicionou a letra e a melodia vocal?
Essa música em particular foi começada em Los Angeles. Eu e o James vivemos lá agora e temos andado a fazer muita música juntos, e essa foi uma daquelas que tínhamos feito e com que não sabíamos o que fazer. Então eu mandei-a ao Kai, ele gostou muito da ideia e foi até LA para a acabarmos juntos. Eu acho que o James esteve brilhante em termos de conteúdo. A coisa de trabalhar com vocalistas é que, não havendo muita história de fundo na nossa música, eles geralmente conseguem trazer muito mais uma mensagem, e este tema para mim é muito uma história, e com a qual estou muito feliz.

E essa música teve muito impacto na altura de dar nome ao álbum? Porque Love What Survives enquanto expressão transmite muito a mesma energia desse tema.
Sim, eu creio que sim, eu acho que essa é uma das muitas vozes neste álbum e a forma como foi criada também definiu muito o modo como outros temas acabaram por vir a constituí-lo. Porque eu estava em LA e o Kai em Londres, e então passou muito por mandarmos coisas para trás e para a frente.

Vocês quando estão a criar focam-se mais em escrever primeiro a melodia ou o beat?
Neste álbum foi sem dúvida a melodia, as percussões acabaram por vir muito naturalmente, até porque trabalhamos com muitas que já tínhamos usado anteriormente, então não houve muita programação a ser feita, foi mais live recording; fazer gravações das partes dos sintetizadores e depois o nosso baterista Marc [Pell], ou mesmo o Kai, adicionarem isso.

E referiste que para este álbum ouviram muito punk rock, e parece-me que na “You Look Certain (I’m Not Sure)” consegue-se ouvir uma espécie de distorção na guitarra que não é muito usual na vossa música.
Sim, é verdade.

Veio tudo dessas influências? O que vos fez sentir que completava o álbum?
Na música que fazemos nunca tivemos medo de usar nenhuns instrumentos, e esse tema em particular compôs-se muito muito rápido a partir de uma ideia simples. E suponho que para essa música tenha havido uma forte influência dos Stereolab, especialmente com a voz da Andrea [Balency], que tem muito aquele tom europeu, sendo francesa e tudo.

Como conceptualizam que músicas querem que tenham voz ou que sejam só instrumentais?
Nós nunca pensamos nisso. As pessoas com quem trabalhamos, a Micachu, o James, todos eles escolhem se querem ou não cantar nas músicas. Nunca houve nenhum momento em que contássemos que um tema fosse ter voz e acabasse por não ter, ou vice versa. É tudo muito fruto do acaso.

Confiaram a capa do álbum e a realização dos videoclips ao Frank Lebon. O que vos atraiu no trabalho dele? Ou o que acharam que nele ressoava com a vossa música?
Nós trabalhámos com o irmão dele no nosso primeiro álbum e o Frank apareceu com alguma ideias ótimas e pareceu conectar verdadeiramente com a música. Nunca lhe demos qualquer espécie de direção e isso é a beleza de trabalhar com pessoas tão talentosas – conseguem simplesmente fazer as coisas por elas próprias. Ele teve tantas ideias que nos pareceram perfeitas, por isso deixamo-lo avançar.

Tendo o vosso som evoluído tanto ao longo destes três álbuns, tentam que tenha sempre um certo lado sentimental ou deixam-no fluir mais abstratamente, com os instrumentos que optam por usar; focam-se mais naquilo que sentem relativamente à música do que no equipamento?
Nunca é sobre os instrumentos. Nós não somos pessoas muito técnicas por isso é muito mais relativo ao sentimento e ao que nos parece certo usar num preciso momento. Especialmente neste álbum, em que não perdemos muito tempo a remoer nas coisas e fizemos apenas o que nos parecia correto.

Falando de emoções, qual a música mais emotiva para ti, de todo o vosso reportório até agora?
Provavelmente algo do primeiro álbum. Diria a “Carbonated”, porque me relembra muito estar em Londres naquela altura.

E em termos de performance ao vivo. O vosso último concerto aqui foi no ano antes de lançarem este álbum, mas já andavam a tocar algumas músicas dele, se me recordo corretamente. Em que vai diferir, agora que o álbum já foi lançado há um ano?
Antes nós ainda estávamos muito a experimentar os temas; e agora, quer dizer, já estamos a tocar as músicas há tanto tempo, creio que o concerto enriqueceu imenso e que evoluímos bastante, também. Estamos muito entusiasmados em voltar e poder tocar o álbum com todo o seu potencial.

Tem havido alguma reação do publico a músicas que vocês não estavam a espera?
Nem por isso, nós não prestamos grande atenção às coisas da Internet, e a única coisa a que temos tido acesso é ao que as pessoas nos dizem depois de concertos – e a resposta nesse aspeto tem sido muito positiva, relativamente a tudo o que andamos a fazer de momento. Temos de nos focar nas nossas próprias tarefas e aprender tanto quanto podemos de uma audiência cara a cara, mais do que prestar atenção ao que as pessoas dizem na Internet.

Para rematar, estamos no fim da época de festivais na Europa e América. Houve alguns concertos ou artistas que gostaram particularmente este ano? Algumas recomendações?
O Primavera [Sound Barcelona] foi fantástico. Gostei bastante do nosso concerto lá. Vimos o King Krule, ele é incrível, por acaso hoje vamos tocar num festival e ele toca logo a seguir a nós, vai ser bom poder vê-lo outra vez. Os Tame Impala, que vimos no Pitchfork de Chicago, foram muito bons também. Não temos tido tempo para ver grande coisa, infelizmente, porque como andamos a viajar tanto e com tanta coisa, no fim dos concertos temos simplesmente de ir embora, não há grandes oportunidades para ver mais; mas sim, esses dois destacam-se na minha memoria.

Entrevista com contribuições de Sara Camilo

Gostas do trabalho da Comunidade Cultura e Arte?

Podes apoiar a partir de 1€ por mês.

Artigos Relacionados