Mas quem são os “amigos do povo”?

por Comunidade Cultura e Arte,    5 Novembro, 2019
Mas quem são os “amigos do povo”?
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Líder da extrema-direita refere: “Quantos mais apoiantes tiver o Ventura, melhor para nós.”

Existe uma camada populacional que se pode considerar “terreno fértil” ao discurso despolitizado e populista de André Ventura. Quem também vê isso com agrado é o ex-condenado neo-nazi Mário Machado, que refere nos comentários do seu canal do Youtube o quão benéfico é a normalização do discurso daquela que ele diz ser “a Direita”. A incompreensão deste discurso e o apoio ao oportunista André Ventura, ajuda ao crescimento da extrema direita mais fanática em Portugal. O fascismo espreita a oportunidade no discurso de ódio que o Chega profere. O mesmo discurso que ouvimos, como ele próprio diz, nos cafés.

Estamos a falar de um partido no qual um Skinhead se revê ao referir: “são em alguns pontos o que nos são mais próximos”. E salienta que o Chega vai “tocar em assuntos que nos são queridos”. E que “vai ser benéfico para normalizar e vulgarizar o seu discurso”. Afinal é o próprio que o diz ainda no seu vídeo intitulado “Mário Machado: Deixo aqui o meu número de Whatsapp” (entretanto eliminado): “Quantos mais apoiantes tiver o Ventura, melhor para nós. Nós queremos o Chega forte.”

Para quem não sabe, Mário Machado é um ex-condenado acusado por discriminação racial, coacção agravada, detenção de arma ilegal, danos e ofensa à integridade física qualificada, de difamação, ameaça e coacção a uma procuradora da República e de posse de arma de fogo. Para além disso, diz que tem “vários pontos em comum” com o populista André Ventura, líder do partido Chega.

A opinião popular é importante, afinal é para o povo que a política deve trabalhar. Contudo, nem sempre o povo está do lado certo da história. Basta ver a tomada de poder de Mussolini e Hitler no século XX. O povo, nalguns casos, deixa-se levar pela emoção e frustração fruto da deterioração das condições objetivas de vida que muitas vezes se traduz em reacionarismo e ódio social. Basta ver um dos casos mais discutidos nos espaços de convívio populares: Os ciganos e o RSI são um problema. Uma espécie de miopia que dá mais relevo ao ódio por minorias, do que ao saquear constante que temos vindo a sofrer em torno do jogo de casino da banca privada. Quando apenas 3,8% dos beneficiários do RSI são ciganos.

Em primeiro lugar, é preciso perceber que a extrema-direita já tem caminho aberto na democracia portuguesa. O próprio sistema institucional, através da Assembleia da República e a comunicação social, serão um dos pilares mais fortes para a propagação destas ideias nefastas. Porém, a meu ver, não a mais disseminadora. As redes sociais, cada vez mais mobilizadoras e determinantes para a construção de orientações político-ideológicas, serão o terreno fértil para o semear da onda de extrema-direita que todos os democratas pressentem. É aqui que a extrema-direita fez e faz o seu caminho.

O Chega, partido oportunista que cresce à custa dos discursos de ódio que, vemos em crescendo nos meios mais populares e nas redes sociais, cansados dos falhanços da direita tradicional, é um partido que defende, por exemplo a prisão perpétua quando Portugal foi o primeiro país a abolir tal medida (uma medida judicial progressista que o populismo pretende apagar). O Chega quer retirar o aborto e as cirurgias de mudança de sexo, do conceito de saúde pública, o que “implicará o fim imediato dos apoios do Estado e da subsidiação quer do aborto, quer da mudança de sexo através do Serviço Nacional de Saúde, ou seja, pagos pelo contribuinte”. A verdadeira política de quem não se mete na sua própria vida.

Mas também a defesa da castração dos pedófilos, a constitucionalização da proibição da eutanásia e a ilegalização do casamento entre pessoas do mesmo sexo, numa rejeição do que hoje está estabelecido sobre as democracias inclusivas e respeitadoras da diversidade individual.

Também lá se encontra, a exclusão dos ciganos e o combate à imigração, com a proposta de fecho de fronteiras, típicas da estigmatização e perseguição por critérios étnicos, raciais e xenófobos, a exclusão dos mais frágeis e desprotegidos que têm direitos garantidos pela Segurança Social dentro do atual Estado-providência, pilar da democracia. Ideias que tem defendido em palavras e em cartazes, como é exemplo o mais recente em Lisboa, que se viu em campanha: “Andamos a sustentar quem não quer fazer nada”. Será que está a falar de si próprio ou vai falar contra o Luís Filipe Vieira e a sua dívida astronómica à banca? A Imosteps, uma holding do presidente do Benfica, faz parte da lista de 60 grandes devedores do Novo Banco. Uma dívida que ascende os 54 milhões de euros, um problema muito maior do que os 3,7% de pessoas de etnia cigana que recebem o RSI.

A desestruturação das direitas ditas “tradicionais” e a propagação do discurso da extrema direita, são um desafio para qualquer militante de esquerda. Isto porque existem caminhos favoráveis para um crescimento exponencial da ideologia de ódio no pior das redes sociais e da comunicação social.

A esquerda e até mesmo os restantes democratas de centro e centro direita que ignorem esta situação e sobre ela, negligentemente, não tomem medidas de combate a este discurso, precocemente poderão enfrentar o crescimento exponencial destes movimentos.

O combate faz-se nas propostas para a melhoria dos serviços públicos que permitam a efetividade dos direitos que deveriam ser universais e o combate à corrupção e desvio de capitais para offshores. Precisamos de estratégias de campanha que nos permitam combater de forma eficaz a extrema direita. Precisamos de mostrar quem são os verdadeiros amigos do povo.

Artigo de Dilan Granjo
Dilan tem 26 anos é pós-graduado em Ciência Política e formado em Marketing Digital na Universidade de Aveiro. Ativista e dirigente político, pensa que a disputa de ideias é essencial para o progresso da sociedade. 

(artigo editado às 16h26 de dia 5 de Novembro)

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