‘Marble Skies’ e os vários ritmos dos Django Django

por Bernardo Crastes,    6 Fevereiro, 2018
‘Marble Skies’ e os vários ritmos dos Django Django
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Sem expectativas, um álbum de estreia pode impressionar-nos especialmente, pois não há uma fasquia a ser ultrapassada. Os Django Django apareceram em 2012 com um álbum de uma sonoridade excepcional e difícil de ignorar: uma espécie de western alienígena, com guitarras desérticas usadas amiúde e sintetizadores sci-fi. Quando assim é, os álbuns seguintes serão sempre analisados com uma lupa talhada pelo trabalho prévio, inevitavelmente. 2018 traz-nos Marble Skies, que pretende unir a marca distinta do álbum de estreia homónimo com os impulsos mais revivalistas daquele que se seguiu, Born Under Saturn, avançando numa direcção mais dançável e próxima de influências dos anos 80.

A primeira canção, que dá nome ao álbum, lança o mote para esse conceito criativo. Abre com ecos reminiscentes das paisagens de Django Django, rapidamente rebentando um ritmo infeccioso digno de uma trilha sonora dos anos 80. É uma canção que nos relembra que a banda sempre nos cativou principalmente pela sua componente rítmica. Normalmente, os seus ritmos soavam mais complexos que este, mas a sua familiaridade não retira nada à canção, adequando-se a uma sensibilidade puramente pop, que o grupo já havia explorado, mas nunca tão despretensiosamente.

Outro exemplo rítmico magistral chega-nos por meio do single “Tic Tac Toe”, que vai cavalgando ao longo de um baixo serpenteante e de guitarras que se erguem como montanhas numa matriz computacional qualquer. Soa a musicalização de uma perseguição, por uma paisagem pós-apocalíptica árida, emocionante e entusiasmante; uma espécie de Mad Max em forma de canção. Traz algumas reminiscências do antigo single “Default”, pelos samples sonoros que a povoam e pela dose de elevadas octanas que a banda imprime na música, conjurando uma urgência que torna a canção fugaz, ao mesmo tempo que se retém na nossa mente, impelindo-nos a voltar a ela por muitas mais vezes.

Por outro lado, buscas de novas abordagens e outras replicações de sons antigos resultam em algumas canções pouco marcantes, espalhadas pelos primeiros 25 minutos do álbum. A falta de hooks melódicos eficazes ou de uma estrutura mais interessante torna canções como “Sundials” em rascunhos com boas intenções, que acabam por não transcender o estatuto de música competente. “Surface to Air” traz a colaboração de Rebecca Taylor – aqui creditada como Self Esteem – membro dos belíssimos Slow Club, numa participação algo desapontante. A voz carismática de Taylor parece meramente servir a canção, sem ir além do ritmo linear, roubando-lhe o condão das vocalizações divertidas de Vincent Neff, que adicionam personalidade à música da banda.

Esta estagnação é eficazmente revertida na recta final do álbum, bem à moda dos Django Django, cujos álbuns costumam guardar os seus melhores trunfos para o final. Aqui, essa sequência começa logo na sétima canção, “Beam Me Up” – o baixo e os sintetizadores adicionam um negrume ácido incomum no som da banda, que é equilibrado pela voz e batida texturizada; batida essa que desagua no beat quase techno que chama a atenção para uma canção que não soaria deslocada do álbum de estreia, “In Your Beat”, cujo refrão épico não sofreria com uma produção mais desavergonhada e hínica. É clássico Django Django – se é que já se pode afirmar isso da sua música, que surgiu há uns meros seis anos – e facilmente entrará no top de melhores canções da discografia.

“Real Gone” usa novamente uma assinatura rítmica acelerada a seu favor, mas numa estrutura bem mais progressiva, que atesta a capacidade de composição do grupo, introduzindo elementos novos nos momentos certos; notavelmente, a dois minutos do fim, entram umas teclas estelares que são um autêntico mimo. O fecho deste álbum deixa algo a desejar quando comparado com “Silver Rays” e “Life We Know” – canções que terminam os álbuns anteriores – mas “Fountains” lucra pela sua posição após um segmento mais agressivo, tornando-se numa lufada de ar fresco que equilibra o ambiente do álbum, especialmente quando atentamos à sua guitarra solarenga.

Marble Skies revela uma decisão inteligente dos Django Django, que fizeram deste o álbum mais curto da sua ainda curta carreira. Desta forma, salientam o que de melhor fizeram neste trabalho, elevando-o acima das canções que não espelham tão bem a personalidade e música magnética da banda londrina. No fim, é isso que fica da audição do álbum, e que nos trará de volta ao mesmo.

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