‘Malmequeres’, de Chinaskee & Os Camponeses: a juventude cruza-se com a sabedoria do rock

por João Horta,    20 Dezembro, 2017
‘Malmequeres’, de Chinaskee & Os Camponeses: a juventude cruza-se com a sabedoria do rock
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O livro Música para Aguardente, de Charles Bukowski, foi ponto de partida para o pseudónimo de Miguel Gomes (Chinaskee); a ele juntam-se agora Os Camponeses, em homenagem ao primeiro EP, Campo. O quarteto formado por David Simões (Trovador Falcão) no baixo, Luís Tojo (SunKing) nas teclas, Ricardo Oliveira na bateria e Bernardo Ramos na guitarra, estiveram por detrás do full-lenght de estreia, editado pela Revolve. “Muito brainstorming e tardes passadas em esplanadas”, é assim que Chinaskee e SunKing se referem ao processo criativo de Malmequeres.

Até agora, Chinaskee apresentava-se sozinho, embora na realidade nunca tenha estado, confessa até que a primeira vez que compôs acompanhado foi com SunKing: “Ficámos até às tantas a gravar na casa-de-banho”. Porém, Malmequeres veste-se de “muitas ideias, todas elas gravadas e, de certa forma, aproveitadas para o álbum”. A produção de Filipe Sambado encarregou-se de “dirigir essas ideias, dar directrizes e aconselhar”, revelam os músicos à Comunidade Cultura e Arte.

A juventude e a maturidade são dois pontos completamente antagónicos; mas no caso de Chinaskee & Os Camponeses acontece o inverso, jovens de sabedoria rock e poesia singela, que tem tanto de profundo quanto de simplicidade lírica. É isso que Chinaskee nos conta: “tocamos de acordo com os nossos sentimentos e conforme o nosso estado de espírito” – o que explica a viagem de Malmequeres sobre cantigas de alegria desenfreada, frescura primaveril e narrativas joviais. No entanto, faixas como “Mal Me Queres” demonstram que, também há espaço para composições sorumbáticas, de arranjos e versos nostálgicos.

Dia de Praia propõe “molhar os pés à beira mar / ver as curvas dos corpos passar”, sugere abraços aos dias de sol e à cidade que os viu nascer, Lisboa. Estes rapazes levam a vida boémia lisboeta para o disco, sente-se a atmosfera da cidade naqueles teclados melodiosos, de recortes psicadélicos e inspirações late 60’s. Mas Chinaskee é claro na relação com as influências: “Descolamo-nos muito das influências da música estrangeira, gostamos muito da nova cena da música portuguesa e essa é a nossa principal inspiração”.

O percurso até este álbum fez-se de amizade e consideração por bandas como Mighty Sands ou Galgo. Apesar disso, as canções de Chinaskee & Os Camponeses constroem uma identidade própria, criam o seu próprio habitat e afastam-se das sonoridades convencionais do cancioneiro mais popular da actualidade. A faixa de abertura, “Odor“, denuncia guitarras dançantes, salpicadas pela sujidade e crueza do rock, completando-se com o que Chinaskee sabe fazer melhor: escrever. “Foi a partir da experiência do Chinaskee com banda, que começou a escrever para e com outras pessoas” refere SunKing. Assim se eleva todo o sentido lírico e construção estrófica de Chinaskee & Os Camponeses.

Malmequeres transporta todas as referências da música portuguesa contemporânea que interessam; contudo, as alusões ao passado também residem lá e consolidam o disco. Do início ao fim, o cruzamento de palavras belas e instrumentais harmoniosos, onde cabe a humildade das histórias cantadas, das paixões, dos desencontros, da Lisboa solarenga e da Lisboa nocturna. Um conjunto de sete canções – ou oito (descubram a hidden track) – à espera de se tornarem, também elas, numa bem merecida referência da música portuguesa.

Fotografia: Maria Inês Peixoto

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