‘Lemonade’, de Ioana Uricaru, é um forte candidato ao Lince de Ouro no Fest

por Comunidade Cultura e Arte,    21 Junho, 2018
‘Lemonade’, de Ioana Uricaru, é um forte candidato ao Lince de Ouro no Fest
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Mara e Dragos são romenos, a jovem é mãe solteira do menino de oito anos. Enfermeira, Mara deslocou-se para os Estados Unidos cerca de sete meses antes, inserida num programa para cuidados de saúde. Através desse programa conheceu Daniel. O acidente que o levou aos cuidados de Mara aconteceu a um mês do visa dela expirar. Ainda estava legal quando casaram. Esta é a história que Mara repete insistente e consistentemente, ao ser entrevistada para a obtenção do green card. Mara ama o marido, repete. O filme não confirma o relato, mas não nos oferece outra verdade.

Lemonade de Ioana Uricaru, exibido ontem em Espinho no âmbito do FEST – Festival Novos Realizadores | Novo Cinema, é um dos candidatos ao Lince de Ouro. Esta é a primeira longa-metragem da realizadora romena, radicada nos EUA desde 2001. A obra, estreada em Berlinale, foi desenvolvida através da Residência Cine-fundação do Festival de Cannes e do Laboratório de Realizadores, em Sundance. Anteriormente, Uricaru viu filmes seus selecionados para ambos os festivais.

Dragos chega aos EUA durante o processo de legalização da mãe. Uricaru guia-nos então por um país patriarcal com um sistema corrupto de abuso de poder e exploração sexual. A perspetiva feminina da realizadora torna-se relevante na representação irrepreensível da protagonista, interpretada com uma subtileza brilhante por Malina Manovici.

O contexto político e económico que vivemos hoje abriu espaço a novos realismos. A crise económica, a crise de refugiados, a crise migratória e as provas repetidas de uma democracia enfraquecida na extensão dos continentes impulsionaram o cinema a reagir. Lemonade enquadra-se nesta nova vaga de realismo que tem invadido produções recentes do cinema independente. O tema social e os planos sequência, em câmara-à-mão, revelam raízes do neorrealismo italiano. Mas o olhar de Ioana Uricaru não explora a compaixão do espectador, não vitimiza.

O que Uricaru tem de particular é uma sensibilidade extremamente apurada de medida. Talvez proveniente da sua experiência de editora. Enquanto realizadora e como argumentista, Uricaru para sempre antes de ser demasiado. Aponta, mas não expõe. E sob o olhar dela observamos factos e silêncios, a ação e o tempo, sempre na dose certa.

Artigo escrito por Inês Lebreaud

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