Johan Cruyff: o grande criador do futebol moderno

por Comunidade Cultura e Arte,    24 Março, 2020
Johan Cruyff: o grande criador do futebol moderno
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Pouco antes deste mês e do início do movimento para 2015, Johan Cruyff foi diagnosticado com um cancro nos pulmões. Certamente um duro golpe para o próprio que não deixa indiferentes muitos adeptos de futebol, emergidos ainda pela imagem do treinador que viria a deixar os cigarros, após um valente susto. Nunca tive o prazer de ver jogar o holandês, mas ainda criança quando comecei a apreciar timidamente o desporto rei, já o dream team do Barça, sob o seu comando, dava espetáculo. 

Numa era em que esquemas táticos como o 4-4-2 ou o 3-5-2 predominavam, Cruyff pega no 4-3-3 sobre o qual jogara no Ajax e desenvolve o 3-4-3. Não se assistia ao nascimento de uma filosofia propriamente dita. Ela já existia. Assistia-se a mais do que isso. Pegava-se na mesma, desenvolvendo-a, e criava-se um sustento em torno dela. O “cruyffismo” é um futebol de posse, obcecado pela bola e pelo ataque. Um jogo de domínio posicional em que os movimentos ofensivos começam a ser construídos pela defesa. Uma marcação alta, criação de espaço e desorganização do adversário por intermédio da troca de passes constantes são alguns dos elementos essenciais. 

Uma visão do futebol que só é possível com supremacia técnica e que determina a escolha deste tipo de jogadores no lugar de outros com mais força ou tamanho. Não era raro ouvi-lo relevar jogadores de baixa estatura como Sergi, Amor ou Ferrer, e o seu toque de bola e forte pressão sobre o adversário que nem “ratos”, em detrimento de outros com maior força física. Em relação a Guardiola, afirmaria mais tarde que a sua inteligência facilmente colmatava algum défice físico e era isso que procurava num jogador.

Tudo isto perderia força se o seu Barcelona não tivesse sido o que foi. Mas mais ainda se esta filosofia ou conceito do jogo, que vai muito para além do mesmo, não tivesse feito escola no seu clube até aos dias de hoje. Um conceito que influenciou como nenhum outro, treinadores e jogadores por todo o mundo. Será muito difícil encontrar uma equipa no século XXI cuja hegemonia vitoriosa chegue perto do Barça de Pep Guardiola. 

Um novo dream team cujo papel principal cabe hoje a Luis Enrique. Nele, vive um passado de sucesso sem igual neste desporto, sempre pela filosofia do futebol total, que para além da vitória, procura em cada jogo, o que de melhor o espetáculo tem. Como disse Guardiola antes de deixar o clube catalão, Cruyff pintou a capela e desde aí todos os treinadores do Barcelona meramente a restauraram ou melhoraram. 

A verdade é que também hoje será impossível imaginar o futebol da seleção espanhola com outra filosofia senão esta. Tal como no clube catalão, foi com ela que conheceu os maiores feitos da sua história.                

Em sintonia com outras áreas da vida, chegará o momento em que a criação de Cruyff se desenvolva de tal maneira que a sua raiz seja dificilmente identificável. Ou que seja substituída por outra sem o sucesso desta. Falar-se-á de outros supostos criadores e pensadores do jogo, mas nenhum conseguirá o que o holandês conseguiu. É aqui que ele ganha a qualquer outra grande glória do desporto. 

Como se não bastasse o que me dizem do que ele foi enquanto jogador, a sua obra-prima estaria reservada para depois. Acredito mesmo que ele já desconfiava disso quando acabou despedido do Barcelona. Percebeu que nenhum outro cargo dessa relevância faria sentido pelas sementes que já deixara plantadas.

E porque as homenagens também se fazem em vida e em especial para alguém que luta contra uma doença, como simples adepto de futebol – não poderia deixar também de dedicar o meu movember a este monstro criador. 

Que dance sobre o cancro tal como ensinou os jogadores do Barcelona a dançar entre os adversários. 

Texto de Gonçalo Ribeiro Telles

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