Iceage no Jameson Urban Routes: a estreia que nos tirou as dores

por Sara Miguel Dias,    30 Outubro, 2018
Iceage no Jameson Urban Routes: a estreia que nos tirou as dores
Iceage / Fotografia de Ana Viotti
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Aproximando-se o fim de mais uma edição das Jameson Urban Routes, foi a vez dos Iceage subirem ao palco do Musicbox, em Lisboa. A banda dinamarquesa foi a primeira confirmação do evento, regressando aos palcos portugueses para apresentar o fantástico Beyondless, lançado no inicio de maio.

Como previsto, a noite começou pelas 21h30. Os Palmers subiram ao palco e imediatamente encheram a sala de rock garageiro e rebelião juvenil. O trio português é ainda novato, mas a sua sonoridade, composta por guitarra, baixo e bateria, conseguiu adequadamente antecipar a banda que os sucedia, energizando uma plateia cada vez mais composta.

Os cabeças da noite apareceram por volta das 22h40. A banda de post e art punk, liderada por Elias Bender Rønnenfelt, entregou tanto quanto se podia desejar. Os quatro dinamarqueses que constituem a formação tradicional da banda subiram ao palco acompanhados de mais dois elementos: um saxofonista e um violinista/teclista.

O concerto iniciou-se com uma saudação cordial de Rønnenfelt – “Hello, ladies and gentlemen” – seguida pelo rasgar de cordas dos três primeiros temas de Beyondless: “Hurrah”, “Pain Killer” e “Under the Sun”. Fiéis à apresentação do álbum, tocaram-no praticamente todo na íntegra, com a coordenação de quem o conhece e o tem vindo a tocar há anos, e não há meses; em parte, um reflexo da escolha sensata de terem recorrido ao saxofone e violino, dois importantes instrumentos das gravações em estúdio, que se evidenciaram também como duas vozes instrumentais cruciais durante a noite – é punk, mas com um twist.

O palco do Musicbox, não sendo grande, não apresentou quaisquer limitações para o grupo, como o demonstrou Rønnenfelt, que, entoando a sua voz ébria e profunda, se movimentou, impulsiva e imprevisivelmente pelo espaço, durante todo o tempo de espetáculo. De microfone em riste, o vocalista trouxe à memória um misto da sensibilidade maníaca de Ian Curtis e do fervor de um Samuel T. Herring, encarnando a persona das letras que escreve.

Elias Bender Rønnenfelt, dos Iceage / Fotografia de Ana Viotti

Perante a música mordaz do reportório, é inevitável uma certa resposta do público, que, em momentos, partiu para o moche. Esta ocorreu particularmente com o retorno aos álbuns anteriores, em “Ecstasy” ou “White Rune”, canções que incitam essa anarquia.

E enquanto “The Lord’s Favourite” trouxe consigo o momento mais melódico da noite no início da atuação, “Catch It”, a última musica antes do encore, trouxe o mais intenso. O encore fez-se depois de uma curta pausa. Entre gritos e aplausos, a banda voltou ao palco e anunciou a música final – “Plowing Into the Field of Love”single do penúltimo álbum, que lhe dá também o nome. A música era aguardada, e foi o perfeito tema de encerramento, capaz de revelar todas as virtudes instrumentais da banda, pela secção rítmica e melodia. Antes de sair, Rønnenfelt mimou com os lábios um “thank you” que quebrou pela primeira vez o olhar visceral que envergava desde a entrada em palco.

Com um perfeccionismo que não se dissipa do estúdio para ao vivo, os Iceage fazem talvez do mais original rock contemporâneo. A postura de distanciamento ficou no palco quando dele saíram e, na altura de arrumar o material, juntaram-se a uma plateia que os esperava para congratular, distribuído baquetas, setlists e assinando bilhetes, CD’s e até dedos alheios. Foi a primeira vez que a banda passou por Lisboa, e ficou claro que o seu regresso será sempre bem-vindo.

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