Em ‘Silver Eye’, os Goldfrapp vão buscar os sons ao centro da Terra

por Bernardo Crastes,    14 Abril, 2017
Em ‘Silver Eye’, os Goldfrapp vão buscar os sons ao centro da Terra
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Electropop, acústico, electropop, acústico, electropop. Desde Supernature, de 2005, os Goldfrapp têm estes dois lados, lançando álbuns fiéis a cada um alternadamente. Após o lindíssimo e tranquilo Tales of Us, de 2013, chega-nos Silver Eye, para confirmar a tendência. Agora que o padrão está confirmado, a banda tem a difícil tarefa de evitar cair na repetição, e este é o primeiro teste.

Silver Eye consegue conjurar uma atmosfera diferente dos álbuns anteriores, ao pegar em elementos de cada um deles e criar uma espécie de síntese daquilo que o duo fez até hoje, ao mesmo tempo que leva os seus sons a locais novos. Parte disso será devido à ajuda na produção da maioria das canções por parte de Bobby Krlic, também conhecido como The Haxan Cloak. A sua marca é notória na amplidão das canções e na profundidade das batidas e sintetizadores, que parecem vir do fundo de uma cratera vulcânica.

O exemplo mais premente desta nova sonoridade é “Zodiac Black”, em que a fragilidade comovente da entrega vocal de Alison Goldfrapp é protegida pelos ecos de batidas negras que trazem à mente os Massive Attack. É uma canção arrepiante e poderosa, que constitui o centro do álbum, juntamente com “Faux Suede Drifter”. Este par de canções encarna perfeitamente o ambiente que o duo criou com este Silver Eye. Por outro lado, “Ocean” também cartografa novos territórios para a banda, revelando uma agressividade destrutiva nunca antes explorada e que mete respeito.

“Beast That Never Was” vai buscar a doçura da voz dos álbuns acústicos e as melodias pop cinemáticas do álbum de estreia Felt Mountain. “Systemagic”, co-produzida com John Congleton (produtor de álbuns de St. Vincent, Wild Beasts, Swans), traz à mente a sensualidade de Black Cherry, com os seus sintetizadores de borracha e látex.  “Everything is Never Enough”, a canção menos interessante do álbum, bebe da synthpop de Head First, de 2010, completa com ruídos de aeroplanos reminiscentes do single desse álbum, “Rocket”, que infelizmente não elevam a faixa às alturas deste último.

Após todas estas referências, fica a faltar uma canção essencial, “Moon in Your Mouth”. Directamente vinda de um qualquer mundo alienígena, é envolvente, quente, sinuosa e, acima de tudo, bela.

Alison Goldfrapp comprova mais uma vez que é a diva subvalorizada que este mundo não merece. A sua voz oscila entre poder, sensualidade, fragilidade e doçura, voz essa que alia a uma postura e imagem cativantes. Junte-se a isso os seus papéis de instrumentista e directora artística da banda, e compreendemos por que o projecto enverga o seu apelido.

Neste álbum, os Goldfrapp parecem não estar a divertir-se (salvo as excepções de “Systemagic” e “Everything is Never Enough”) como nos seus esforços mais leves e divertidos. Em vez disso, vemos o lado concentrado de uma banda que quer ser levada a sério, e não injustamente ignorada ou meramente lembrada como “aqueles da “Ooh La La””. É um álbum seguro, que acerta nas suas passadas e funciona como um bom ponto de partida para novos ouvintes. A direcção certa que o arco da sua carreira seguirá, só o tempo o dirá.

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