‘Automaton’: Sete anos depois e a sonoridade já conhecida de Jamiroquai

por Miguel de Almeida Santos,    11 Abril, 2017
‘Automaton’: Sete anos depois e a sonoridade já conhecida de Jamiroquai
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Há já quase vinte e cinco anos que Jamiroquai nos têm presenteado com a sua música descontraída e jovialmente alegre. A sonoridade acid jazz e funk caracteriza a discografia da banda desde Emergency on Planet Earth até ao projecto mais recente, Automaton. Quem de nós nunca aspirou a viver no universo alimentado a folia e festa que a música de Jay Kay e companhia alimenta, usando cada um dos excêntricos chapéus que o vocalista ostentou ao longo da carreira? Temas como “Cosmic Girl”, “Love Foolosophy”, “Feels Just Like it Should” ou “Virtual Insanity” são apelativos, levianos, escorregam muito bem e convidam à dança. Mas “Seven Days in Sunny June” do álbum Dynamite lançado em 2005 destaca-se especialmente porque conjuga e resume os vários aspectos fantásticos da música de Jamiroquai.

O novo projecto de Jamiroquai chega sete anos depois de Rock Dust Light Star, uma mudança discreta no som da banda que resultou num álbum menos apelativo que os seus antecessores. Ouve-se muita guitarra distorcida e solos “fanfarrões”, resultado de uma abordagem mais rock e menos funk. Mas em Automaton o grupo britânico volta mais uma vez a empunhar orgulhosamente a sonoridade que os trouxe à ribalta e cativou o público. O álbum está cheio de músicas que não fogem da zona de conforto de Jamiroquai mas soa confortavelmente agradável. Dá para a festa e para dançar até os pés cederem.

O baixo (de cordas ou sob a forma de sintetizador) é mais uma vez um dos elementos mais preponderantes neste projecto. A sua força indomável faz-se sentir e o seu som pavoneia-se pelos vários temas que compõem o álbum, imprimindo um groove grave e comprimido com muito estilo. Em “Cloud 9”, o “borrão” que passa por baixo complementa fielmente a guitarra funk (reminiscente de Random Access Memories dos Daft Punk) e a voz aguda de Jay Kay adequa-se ao resto da música. Em “Something About You”, um baixo “hiperactivo” aliado a uma bonita melodia de violinos faz desta música um boogie interessante, apesar de os versos “You’re like candy crush/Two hits I was addicted to ya” serem dolorosamente constrangedores. “Superfresh” também revela um passear possante de baixo acoplado a uma batida muito upbeat, desde o início calmo até ao rasgar intermitente da guitarra que se vai ouvindo por trás. Os violinos que se fazem ouvir neste tema também são um pormenor bem-vindo, muito disco, outro género musical que marca presença nas músicas de Jamiroquai. A faixa inicial “Shake It On” também beneficia de cordas que “dançam” ao som da música que adornam de maneira fantástica.

A sonoridade é relativamente constante ao longo do álbum, sem fugir ao estilo quente pintalgado por uma aura de espaço e exploração interestelar. “Summer Girl” espelha bem essa dualidade, a música chama claramente por calor mas não destoa como banda sonora de uma viagem interplanetária. “Vitamin” também se adequa a esta descrição, um tema com mais andamento, mais rápido e com direito a um solo de saxofone fervoroso. Mas há duas músicas que se destacam do álbum pela positiva e que mostram um suave abraçar de novas influências: o single e faixa-título “Automaton”, que com a sua batida agreste e dissonante assalta os ouvidos sem esquecer de nos fazer abanar a cabeça, mostrando o estilo de Jamiroquai com uma atmosfera perscrutante que se revela alegre no refrão transcendente. O tema “Carla” também se destaca do resto do álbum pela sonoridade meio synthpop misturada com o funk já conhecido de Jamiroquai, terminando o álbum com uma faixa entusiasmante.

Há certas músicas que seriam melhores se fossem mais curtas, a repetição excessiva acaba por denegrir a qualidade geral desses temas. “Hot Property” tenta colmatar essa repetição saltando entre partes musicais mas não deixa que as mesmas se desenvolvam o suficiente, ficando da música o bom riff de sintetizador no refrão. “Nights Out in the Jungle” também sofre do mesmo problema: o baixo, ainda que cativante, repete-se demasiado numa música simplista que tem pouco por onde se lhe pegue. A única parte verdadeiramente interessante é o final caótico de flautas, ferros e outros pequenos instrumentos de percussão, que faz com que o ambiente se torne mesmo numa selva, com barulhos aleatórios de animais a conduzirem a música até ao seu fade out.

As duas décadas de música de Jamiroquai servem como base para este novo projecto prazeroso e muito ao estilo da banda. É um regresso à forma e mostra que os sete anos que passaram desde Rock Dust Light Star serviram principalmente para aprimorar um som que a banda já domina. A sonoridade de Jay Kay e sua trupe continua viva e cheia de calor, adequada às estações mais quentes. Automaton é um bom regresso de Jamiroquai e um álbum para se apreciar numa tarde de Verão, acompanhado de uma bebida com um nome caro e de olhos escondidos atrás de uns óculos de sol cheios de pinta.

Músicas preferidas: “Shake It On”, “Automaton”, “Superfesh”, “Carla” e “Summer Girl”
Músicas menos apelativas: “Hot Property” e “Nights Out in the Jungle”

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