Ana Matos Pires: “A falta de investimento na saúde mental foi uma decisão política”

por Fumaça,    9 Outubro, 2018
Ana Matos Pires: “A falta de investimento na saúde mental foi uma decisão política”
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Em janeiro de 2008, era aprovado em Conselho de Ministros o Plano Nacional de Saúde Mental, um documento sem precedentes, que deveria ser implementado durante os oito anos seguintes, até 2016. A introdução do documento abria com  o tópico: “1 – Saúde mental: uma prioridade de Saúde Pública”.

Passaram-se mais de 12 anos e o prazo foi, entretanto, alargado até 2020. Para Ana Matos Pires, psiquiatra, Diretora do Serviço de Psiquiatria da Unidade Local de Saúde do Baixo Alentejo e presidenta da Associação ARIS da Planície, “o Plano Nacional é um bom plano que ficou por cumprir”, a começar pela tal primeira frase da introdução: “a saúde mental não tem sido uma prioridade” para os governos da última década. E isso “foi uma decisão política”, defende.

Os resultados estão à vista: em 2009, o primeiro relatório do Estudo Epidemiológico Nacional de Saúde Mental, integrado no World Mental Health Survey Initiative, da Organização Mundial de Saúde e da Harvard University, mostrava Portugal com a quarta taxa mais elevada de prevalência anual mundial de perturbações mentais comuns (como a depressão, por exemplo), e a segunda da Europa. Atrás de Portugal ficavam apenas Brasil, Estados Unidos da América e Irlanda do Norte, num total de 34 países.

Já no mais recente relatório sobre o Plano Nacional de Saúde Mental, publicado em outubro de 2017, que avalia o estado da Saúde Mental no país, lê-se: “Temos em Portugal uma das mais elevadas prevalências de doenças mentais da Europa; uma percentagem importante das pessoas com doenças mentais graves permanecem sem acesso a cuidados de saúde mental, e muitos dos que têm acesso a cuidados de saúde mental continuam a não beneficiar dos modelos de intervenção (programas de tratamento e de reabilitação psicossocial), hoje considerados essenciais”.

Mas o mais impressionante nestes dados é perceber que, hoje, as conclusões e avisos dos relatórios encomendados governo são, nalguns casos, as mesmas que há dez anos. No tal Plano Nacional de Saúde de 2008, mencionado acima, lê-se: “(…) apenas um pequena parte das que têm problemas de saúde mental têm acesso aos serviços públicos especializados de saúde mental”.

E o mesmo acontece com tantos outros programas ou legislação: “não saíram da gaveta”, diz a psiquiatra sobre o Plano Nacional de Prevenção de Suicídio, aprovado em 2013, com duração de quatro anos, até 2017. O Plano – que na sua opinião é “excelente” – “terminou o ano passado não tendo sequer chegado a começar”, lamenta.

Nesta entrevista, lançada na véspera do Dia Mundial da Saúde Mental, que se comemora a 10 de outubro, conversamos sobre o que ficou por fazer em décadas aparentemente perdidas nas políticas públicas de Saúde Mental, sobre prevenção de suicídio, e sobre o futuro do Serviço Nacional de Saúde e da Lei de Bases da Saúde, que tem vindo a ser discutida.

Se tens pensado em suicídio, contacta a linha SOS Voz Amiga, pelo 800 209 899, ou procura o teu médico de família.

Texto e entrevista: Ricardo Esteves Ribeiro
Preparação: Pedro Miguel Santos e Ricardo Esteves Ribeiro
Fotografia: Frederico Raposo
Vídeo: Bernardo Afonso e Frederico Raposo
Som: Bernardo Afonso

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