A arqueologia antropológica de Colin Renfrew

por Lucas Brandão,    6 Agosto, 2018
A arqueologia antropológica de Colin Renfrew
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Colin Renfrew deu passos importantes naquilo que é, nos dias de hoje, assumido como a arqueologia. No entanto, muitos desses passos foram dados com o apoio da antropologia, na qual também se especializou. Nesta dialética de saberes e de discursos, o britânico vem desenvolvendo um trabalho relevante no estudo das origens indo-europeias, sustentando-se no legado arqueológico para o traçado antropológico. Também conhecido como Lord Renfrew of Kaimsthorn, é uma das figuras mais consideradas no estudo humanístico e antropológico na comunidade académica do Reino Unido e, por consequência, da Europa.

Andrew Colin Renfrew nasceu a 25 de julho de 1937, em Stockton-on-Tees, no Reino Unido. Após se licenciar no Hertfordshire College, prestou serviço militar na Força Aérea Britânica durante dois anos, depois dos quais direcionou o seu tempo para o estudo das ciências naturais, da arqueologia e da antropologia em Cambridge. Seria nestas matérias que se voltaria a graduar, no ano de 1961, edificando o caminho para a sua tese de doutoramento: “Neolithic and Bronze Age Cultures of the Cyclades and their external relations”, no estudo da evolução antropológica nas ilhas Cíclades, na Grécia, a partir de aspetos arqueológicos. Em 1965, tornou-se investigador nas áreas de pré-história e arqueologia em Sheffield, função da qual partiu para escavações arqueológicas na Grécia e no arquipélago das Órcades, no Reino Unido.

Membro do partido conservador inglês, Renfrew candidatou-se e perdeu no círculo eleitoral de Sheffield Brightside, embora mantendo-se associado a esta força partidária pelos anos subsequentes. Membro das Sociedades de Antiguidades inglesa e escocesa, lançaria “Before Civilisation: The Radiocarbon Revolution and Prehistoric Europeu” em 1973, onde consolidou a ideia de inovação cultural e civilizacional oriental que, paulatinamente, se propagou pela Europa. A partir de 1981, daria aulas de Arqueologia na Universidade de Cambridge até se tornar jubilado, vinte anos depois; não obstante, permaneceu como diretor de vários conselhos e institutos de investigação teórico-prática relacionados com a arqueologia, como o McDonald Institue for Archaeological Research, ao abrigo da Universidade de Cambridge. Entretanto, seria contemplado com galardões respeitantes a este trabalho, com o Prémio Balzan (2004). Tornou-se membro constituinte da British Academy, destinada às ciências e humanidades, para além de membro estrangeiro. na norte-americana National Academy of Sciences.

Tendo em conta as origens das populações indo-europeias, a teoria que vigorava em meados do século XX era a hipótese Kurgan, apresentada pela lituana Marija Gimbutas em 1956. Cruzando a arqueologia com a linguística, naquilo que são as origens dos idiomas proto-indo-europeus, esta teoria, com um nome que, em russo, significa “monte funerário”, aborda as centralidades nas estepes do Mar Cáspio e no sudeste da Europa, naquilo que correspondem a entre o quarto e o terceiro antes de Cristo. A quantidade de deslocações acaba por consolidar a sua manifestação por toda a extensão da Eurásia, focando-se na Anatólia (atual Turquia), na Grécia e no atual Irão. Porém, e mesmo tendo colaborado com a investigadora lituana, Renfrew desloca essas origens para entre o sétimo e o sexto milénios sem a migração propriamente dita, efetivando-se nas práticas culturais e agrícolas que se foram perpetuando. Assim, a sua Urheimat (o lugar original dos idiomas) manteve-se constante em torno da Anatólia, com as suas influências a chegarem aos demais lugares do território europeu e asiático por via dessa proliferação de costumes e de atividades. No entanto, entre os linguistas, a resposta de Renfrew não encontra apoio, muito pelas dificuldades da distribuição geográfica que se fizeram sentir, para além do estudo glotocronológico (estudo de línguas similares entre si e o cálculo da sua separação no tempo).

Estas áreas de estudo conheceram uma nomenclatura própria, dada pelo próprio arqueólogo. Assim, nasceram a paleolinguística e a arqueogenética, cruzando a paleografia com a arqueologia, com a linguística e com a genética, no estudo antropológico das populações ancestrais indo-europeias. Publicações que sumarizam esta perspetiva de Renfrew culminam em “Archaeology and Language: The Puzzle of the Indo-European Origins”, num estudo que consolida a hipótese anatoliana apresentada no parágrafo anterior. As migrações vão sendo feitas até ao extremo ocidente do território eurasiático, migrações essas que, como referido, são mais de um ponto de vista cultural que de geográfico e demográfico. Esta visão ampla e global providencia um olhar sustentado e integrado da arqueologia, fazendo parte de um percurso de descoberta e de investigação, em que a primeira evidência material parte da revelação dos seus técnicos. Trata-se de uma revelação que, em inúmeras ocasiões, foi o passo inaugural para questionar a história e os seus contextos.

A extensa bibliografia e o percurso de estudos e de escavações de Colin Renfrew direcionam o seu estudo num ponto de vista multidisciplinar, que consolida as evoluções das civilizações indo-europeias. Assim, os saberes que se debruçam no que se recupera para lá do solo são vários, que permitem estabelecer uma visão concertada sobre o percurso da humanidade e da civilização até à atualidade. Mais do que a movimentação das pessoas, movimentaram-se os conhecimentos, as práticas e os costumes, que reforçam a premissa de ser muito aquilo que une a humanidade, por mais que a diversidade defina a identidade.

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