‘Yours Conditionally’, dos Tennis, comprova que afinal os anos 70 não acabaram

por Bernardo Crastes,    16 Março, 2017
‘Yours Conditionally’, dos Tennis, comprova que afinal os anos 70 não acabaram
Capa do disco
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Ninguém pensou que os Tennis durassem tanto tempo. Um casal que fez um álbum para documentar a sua expedição náutica, encetada ao longo de oito meses, e que parecia não ter muito mais para dizer. No entanto, aqui andam eles, a lançar álbuns e EPs regularmente desde 2010, nos quais figura o mais recente Yours Conditionally. Curiosamente, este último surge após mais um período passado a velejar, quiçá com a ideia de buscar inspiração.

Yours Conditionally é composto por 10 canções que são o sumo daquilo que a banda tem vindo a fazer; a refinação do seu som twee pop, com claras homenagens às décadas de 60 e 70. A produção está mais limpa, algo que assenta bem no som solarengo e cristalino.

“Modern Woman” é o momento mais bem conseguido do álbum. A melodia lindíssima e calmamente dedilhada desemboca num refrão tão lo-fi que a canção quase não consegue conter a emoção por si conjurada, escondendo a frágil voz de Alaina Moore de uma forma que não a reduz, mas que a torna ainda mais emotiva. Juntemos à música o vídeo fenomenal e evocativo (aqueles caracóis!) e temos, provavelmente, o melhor daquilo que os Tennis produziram até hoje. Por essa altura, estamos quase no fim do álbum, altura em que a belíssima e tropical “Island Music” leva a ideia da música de Verão (em que praticamente todo o catálogo da banda se encontra) a todo um outro nível.

“Matrimony” e “My Emotions Are Blinding” são mais exemplos de melodias bem utilizadas em refrões infecciosos, daquelas que ficam no ouvido após ouvir o álbum, mesmo que não saibamos exactamente de onde elas vêm. Isto é porque, com alguma desatenção, as canções podem misturar-se umas com as outras, nomeadamente as mais indistinguíveis.

As letras são simples e normalmente pintam um mundo em que tudo é cor-de-rosa (como a tonalidade da capa), sem olhar muito para fora das limitações que a alegria e tristeza comedida desse mundo impõem. No entanto, têm alguns toques de mestria métrica e o subvertimento sarcástico de “Ladies Don’t Play Guitar”, em que Moore canta sobre não tocar guitarra e viver para acompanhar o marido na sua demanda musical, o que claramente não corresponde à realidade e demonstra um humor mordaz da sua parte.

Olhando para trás, podemos traçar o percurso dos Tennis como uma exponencial crescente. Não que este Yours Conditonally seja uma obra-prima, nem que os álbuns anteriores sejam para descartar. A carreira da banda tem sido extremamente consistente em termos de fazer música prazerosa e descomprometida, mas realmente nota-se uma progressão natural que vai culminando a cada lançamento, sinal do desenvolvimento artístico e pessoal do casal, apesar do seu som se manter essencialmente na destilação das suas influências musicais, sem pioneirismos. Para já, Alaina Moore e Patrick Riley encontram-se satisfeitos a criar assim.

Essencialmente, este é um álbum que não existe para nos desafiar, nem para desafiar as barreiras da música, e sabe isso. Coloca-se numa posição confortável de uma forma inocente, uma que dificilmente fará com que alguém desgoste do mesmo. Sem ser transcendente, é um muito bonito testemunho. Encare-se a sua audição como ir velejar: faz-nos felizes, mas, quando em demasia, também pode enjoar. Sabe bem tirar o barco da marina de vez em quando.

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