Paredes de Coura dia 4: Portugal. The Man deu início ao fim do Paraíso de Coura

por Gabriel Margarido Pais,    30 Agosto, 2016
Paredes de Coura dia 4: Portugal. The Man deu início ao fim do Paraíso de Coura
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Chegara o dia temido por muitos: 20 de agosto. Com ele terminaria a mais recente edição do festival Vodafone Paredes de Coura. Se por um lado eram bastantes as pessoas desanimadas com o regresso à ‘vida real’, tantas ou mais eram as que se roíam em nervosismo, numa espera de semanas, meses e em alguns casos mesmo anos para ver Portugal. The Man a atuar. Foi neste misto de emoções que decorreu este último grande dia de festival, onde eram tantos os que demoraram mais 10 minutos a sair da tenda do que o habitual, com medo de enfrentar a realidade do fim do sonho, quanto aqueles que se enchiam de adrenalina para saltar e dançar um pouco mais alto do que tinham feito em todos os dias anteriores. Querendo com certeza terminar o festival em grande, foi talvez este o dia que levou, no geral, bandas mais conhecidas e com mais fãs aos palcos de Coura, com passagens no palco principal de The Last Internationale, Capitão Fausto ou The Tallest Man on Earth, e no palco secundário arte de Motorama, Cigarettes After Sex, ou uma das bandas revelação da música portuguesa, Grandfather’s House fez-se ouvir.

Coube aos The Last Internationale abrir as festividades no último dia de Coura, e apesar de o público ter sido de longe menor do que aquele que era esperado, a banda de Delila Paz e Edgey Pires (de descendência portuguesa) soube, como habitualmente o fazem, cativar o público que tiveram, e tê-lo-iam feito de igual maneira caso este público chegasse às dezenas de milhares de pessoas. Passaram-se já dois anos desde o famoso (e melhor) concerto que esta banda americana deu na 8ª edição do festival Optimus Alive, onde milhares de pessoas serviram de coro para uma versão de ‘Grândola Vila Morena‘ cantada com o português aleijado de Delila Paz. A banda voltou a um grande festival em Portugal, e apesar de não terem repetido a brincadeira, o ecrã gigante atrás dos músicos encheu-se de imagens alusivas à revolução dos Cravos, quando nele não estava presente a que presumivelmente irá ser a capa do segundo álbum da banda, que ainda não viu a luz do dia. Se assim for,Este Banner Mata Fascistas‘ parece-nos um nome adequado para um álbum de uma banda como os The Last Internationale, que gritam revolução sempre que possível. Esta será, então, a versão moderna e pesada da música do povo, das Grândolas, Vampiros e Touradas. E foi mesmo assim, no meio do povo, que o concerto acabou. Delila invadiu as grades que a separavam de todo o público e cantou e gritou com os fãs enquanto Edgey destruía as cordas da sua guitarra com os próprios dedos (auch), num estado de raiva que mais ninguém consegue imitar. Um concerto muito melhor do que a quantidade ínfima de pessoas no público faria adivinhar.

Foto: Rita Carmo - Blitz

Foto: Rita Carmo – Blitz

Aos The Last Internationale, que invadiram o palco com uma garra e raiva que poucos conseguem igualar, seguiram-se os descontraídos Capitão Fausto. Quem nunca tenha estado numa das edições do passado recente de Paredes de Coura poderia pensar que este seria um concerto bem mais tranquilo do que aquele que tinha ainda há minutos acabado. A música dos Capitão Fausto é bastante mais leve e alegre do que é a dos The Last Internationale, e enquanto os americanos gritam revolução, os portugueses dão o que têm a dar sem pedir muito do público. Mas quem assim o pensasse, estaria enganado! Poder-se-ia, em Paredes de Coura, ver um mosh pit durante um concerto de Simon and Garfunkel, caso fossem eles os músicos da moda no presente. No ano passado a banda da moda foi Tame Impala, este ano, Capitão Fausto. Sendo que o último trabalho de Capitão Fausto é altamente tido como um dos melhores álbuns da música portuguesa nos últimos anos (opinião da qual partilhamos), é impossível negar que se tratam de uma banda da moda. E com isto não quero dizer que são daqueles grupos que desfrutam dos seus 15 minutos de fama e que desaparecerão tal D. Sebastião após os anos de glória. Nada disso. Com isto quero dizer que o mais recente álbum de Capitão Fausto chegou aos ouvidos de tudo e todos (merecidamente) e quando isso acontece, arrasta-se também todo o público para um concerto: o bom, e o mau (e mesmo alguns vilões). Tendo dito isto, o concerto de Capitão Fausto foi exatamente o que alguém que compreenda Paredes de Coura esperaria: uma mixórdia de mosh pits e crowdsurfs completamente desnecessários que destruíram o concerto pelo qual muitas pessoas esperaram horas para ver. Seria inimaginável em qualquer outro lugar deste mundo que um concerto de Capitão Fausto fosse mais perigoso e agressivo do que um de The Last Internationale (isto para comparar com uma banda que também passou por Paredes, minutos antes, pois podemos dizer o mesmo acerca do concerto de Iron Maiden, e isso é mesmo absurdo), mas o público da moda parece adorar gritar e empurrar, sem noção de como aproveitar um concerto respeitando os demais. Não obstante, foi agradável, após fugir à confusão, conseguir ouvir sem ter de manter um olho no palco e outro no público os fantásticos temas da banda do momento portuguesa, que deram um concerto bastante bom, com músicas que agradaram a todos, e fizeram perceber quanto significava para eles voltar a pisar aquele palco, desta vez com uma enchente tão maior de pessoas daquela que se lembrariam ou que imaginariam ser possível.

Seguiu-se a vez de The Tallest Man on Earth, projeto do sueco Kristian Matsson. Kristian chegou e rapidamente encantou com a sua voz de ouro e dedos de mago para a guitarra. Foi um concerto emocionante onde Kristian se abriu para o público como se de amigos se tratassem, onde várias eram as pessoas coladas às grades com lágrimas a escorrer e onde Paredes de Coura deixava de ser a anarquia habitual e passava a portar-se bem, como se The Tallest Man on Earth fosse aquele professor fixe que todos os alunos respeitam. Kristian contou-nos sem grande detalhe algumas das histórias da sua vida, uma delas especialmente emocional sobre o seu divórcio e deixou Paredes de Coura a pedir por mais, num concerto que de tão bom que foi, parece ter demorado cinco minutos. Despediu-se com uma vénia, pois tal como nós olhámos para The Tallest Man on Earth como se fosse de facto o homem mais alto do mundo, o gigante que nos encheu os corações em Paredes, nesse concerto também nós fomos para ele o melhor público do mundo, e o seu agradecimento chegou na forma mais sentida de uma vénia que vi na minha vida. Volta rápido.

Foto: Rita Carmo - Blitz

Foto: Rita Carmo – Blitz

As festividades estavam muito perto de terminar, quando entra em palco Portugal. The Man.  John Gurley parecia ter trazido na pele o frio da sua cidade de residência (Wasilla, Alasca), pois chegou encapuzado num grosso casaco com uma bóina a espreitar por debaixo do carapuço. Não tardou muito para que todo o público que vinha a acumular adrenalina durante todo o festival começasse a fazer-se notar, e a visão mais comum neste concerto foi a de ver de uma só vez cerca de 10 pessoas levantadas pelos coitados do público a dirigirem-se lenta mas assustadoramente em direção ao palco. Foi o último grande concerto desta edição do Festival, onde houve espaço para tudo: desde músicas que todos conheciam e cantavam em uníssono enquanto eram praticadas danças do ventre imaginadas para esquivar as cotoveladas e encontrões dos mosh pits, passando momentos mais calmos onde todos se limitavam a deixar John e amigos munirem os nossos ouvidos de boa música, até um fantástico cover de Oasis que pôs 25 mil pessoas a cantar de uma forma até aqui não vista nesta edição do Vodafone Paredes de Coura.

Após a custosa despedida deste grande concerto, Coura ficou limitado a música eletrónica e Cigarettes After Sex, que à sua maneira muito conseguiram acalmar os ânimos do recinto com a sua música tranquila e estudada. Chegara, mais tarde, com os típicos e muito pouco originais DJ Sets o final de mais uma edição de Paredes de Coura, tomando lugar no dia seguinte a clássica peregrinação de volta a casa e à rotina enfadonha. Quase todos em direção a Sul se dirigiam, e as estradas congestionadas faziam adivinhar o fim de algo gigante, algo que marcou e algo que foi profundamente belo. Apesar de todas as pancadas e encontrões, todos te queremos de volta, Paredes de Coura.

Foto do artigo: Rita Carmo – Blitz

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