A revitalização sonora em ‘Powerplant’ de Girlpool

por Sara Miguel Dias,    24 Maio, 2017
A revitalização sonora em ‘Powerplant’ de Girlpool
Girlpool.
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Cleo Tucker e Harmony Tavidad formaram em 2013 Girlpool, quando tinham apenas 17 anos, e, desde o início tornou-se muito claro o seu propósito: contar histórias. Ou melhor, fazer relatos: das suas experiências, da sua feminilidade e da sua juventude. “Before the World Was Big” saiu em 2015, como uma coletânea desses mesmos desabafos. Com dez faixas assentes nas etéreas harmonias vocais, somente acompanhadas de guitarra e baixo, é um álbum que apela à introspeção e que pede para ser ouvido num estado de isolação e conexão connosco próprios.

Apresentam agora o seu sucessor “Powerplant”. Este, ainda que continue centrado na mensagem e na voz, tem uma clara distinção do anterior: o som, que cresceu. Houve um evidente desvio da sonoridade folk-y que caracteriza “Before the World Was Big”; as guitarras tornaram-se mais agressivas e a bateria foi integrada, havendo mais um elemento a preencher o vazio que outrora só se preenchia dos murmúrios das vozes e guitarras acústicas. É um álbum de rock alternativo, que poderia pertencer quiçá a Waxahatchee, fosse ele menos angustiado, ou a Speedy Ortiz, não fossem as vozes tão doceis.

O single “123” abre o álbum a modos de transição, começando quieta e silenciosa e acabando pujantemente, com as vozes a lutarem por fazer-se ouvir sobre toda a camada instrumental que se desenvolve na linha temporal da música. “Sleepless” por sua vez pega logo nessa asperidade melódica, que é tão fulcral neste álbum, e transforma-a numa espécie de hino à inquietação, quando articulada com a metafóricas palavras nela transmitidas – “you dream to be sleepless”. De modo semelhante funcionam “Your Heart” ou “She Goes By”, que abordam a desconexão, e a falta de comunicação e compreensão, ou “Kiss and Burn”, um lamento de uma relação mal enraizada; ainda, todos estes temas, particularmente pelo uso de dissonância e distorção, preservam muito o som do movimento Riot Grrrl. “High Rise” e “Soup” têm a mesma melancolia nos versos, mas nelas o que mais se destaca é a linha de baixo de Tividade. A capacidade técnica demonstrada nestes temas, pela reinvenção sonora, reforça que, desde o início, a receita para o bom funcionamento da banda sempre foi mais do que somente a harmonização.

“It Gets More Blue”, numa mistura da calma com a tempestade, é uma das músicas mais bonitas do álbum, pela nostalgia que a progressão de acordes invoca e a tristeza da realização de que, como entoam durante a musica Tucker e Tavidad, nem sempre a total devoção a alguém tem o retorno que desejamos – e a bonita forma como tal é descrito em “The nihilist tells you / That nothing is true / I said ‘I faked global warming / Just to get close to you’”.

As duas jovens revelam assim, que conseguem fazer funcionar num registo completamente diferente, mais encorpado, música de harmonização, continuando este, à semelhança do seu antecessor, a ser um álbum de conforto e consolo, que ampara o lado mais emocional da natureza humana.

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