A luz que finda no silêncio

por Lucas Brandão,    1 Fevereiro, 2017
A luz que finda no silêncio
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Encurta-se a luz. Vê-se pouco, muito pouco para além do que inicialmente se concebia. É parco aquilo que se corresponde a todo o sonho que a humanidade transporta. É de dia. Mesmo assim, as névoas tratam de ofuscar toda a evidência que comprove que seja dia. Tudo se apaga, mesmo o céu. Ninguém sabe nem percebe o que se passa. É algo remoto, fora do seu controlo. São eventualidades que se sucedem com regularidade mas que tardam em ter explicação. Por muito que se repitam, a incógnita permanece e nunca esmorece. Pode ser esquecida, ignorada, bafejada com um vento passivo.

O oculto domina perante o dia que se quer desenvencilhar daquilo que o impede de radiar. A ajuda que pede torna-se invisível e inaudível para aqueles que se escondem do outro lado das névoas. A atmosfera tratou de designar esse desagrado como o triste fado daqueles que raciocinam e que se indagam num eterno questionário. Ninguém sabe em concreto o que se passa. Ninguém deixou de querer saber na sua plena consciência.

Talvez bem lá no fundo ainda sobre uma pequena esperança, uma pequena luz que queira irromper pela vaga camada que se apresenta perante o lugar de todas as aspirações. O que se sonha procura reencontrar-se na amplificação celestial. Talvez lá tudo se confirme e se conforme à vontade humana. Até lá, toda a névoa é aquilo que classifica e carateriza o estado da mente, dos tais que não chegam a pensar. É mais fácil declarar a rendição, o final de toda a luta e de toda a contenda perante o esforço hercúleo da afastamento solar, do brilho que aquece e que floresce o olhar.

As nuvens continuam a ser o bloco defensivo que se opõe sem razão. Talvez por destino meteorológico e por suas conexões com uma dimensão distinta e teológica. Ninguém sabe e já faltou mais para que ninguém quisesse mesmo saber. O que é certo é que o Sol continua longe, longe de uma aspiração que corresponda ao desejo mais profundo de libertação. Um sonho que permanece adiado e afastado da sua declaração de vida, da sua efetivação real e material. Até lá, ninguém sabe, ninguém conhece ou reconhece, toda a gente desconhece. Este desconhecimento é generalizado e torna-se multado por aquele que deixa de acreditar. A sanção aumenta de feição consoante cresce e se estabelece neste desenho sem luz.

É tudo uma pintura que remete a um jogo de preto com uma toada de cinza que assume as responsabilidades de se escapar por toda a tela, por muito que esta seja longa. Ninguém se compromete a encontrar a justificação mas a gente sabe que o Sol não brilha como de costume. Por muito descontente, isso fica latente. Não vemos esforços que mostrem que se tenta procurar esse iluminar. Tudo se fica pela ténue mas pesarosa nuvem. A constelação permanece firme numa intriga que se mistura com uma utopia. É por isso que ninguém sabe e que ninguém conhece. Um dia, talvez, se equacione com verdade um alguém que traga o Sol de volta. O brilho perdeu-se e ninguém se redescobre.

Tudo se silenciou. Um pálido e turbulento silêncio. Tudo pasmado, ninguém exclamado. Um silêncio complementado com a figura sisuda da névoa. Um silêncio mordaz marcado pela ausência da radiação voraz. Um silêncio que nada mais do que o paralelo perpendicular daquilo que a humanidade se veio a tornar. Um silêncio que é o silêncio. Um silêncio que se habituou a calar consoante o tempo se mostrou menos a par. O silêncio que é mais do que um silêncio. O silêncio que se silencia nesse silêncio. Silêncio.

Fotografia de artigo: frame de ‘The Neon Demon,

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